Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
GT 053: Estudos Etnográficos sobre Cidadania
Cidadania sob o controle de grupos armados: um estudo de caso sobre a atuação política das milícias nas
eleições de 2022
O controle territorial armado é um problema característico da América Latina e se reflete em segregações
socioespaciais e violações de direitos. Diversos grupos armados estabelecem relações próximas com o Estado e
constroem grande poder político. Na região metropolitana do Rio de Janeiro, as milícias são os grupos
criminosos de maior influência política e têm expandido fortemente seus territórios nos últimos anos.
Segundo o Mapa Histórico dos Grupos Armados (GENI, 2022), elas ocupam cerca de 50% dos territórios
controlados por grupos armados nesta região, com influência sobre 1,7 milhão de habitantes. Diante do
reconhecido poder político das milícias, este trabalho buscou investigar os impactos do controle territorial
por milicianos no exercício da cidadania e da democracia na região metropolitana do Rio de Janeiro. Para
isso, foram realizados, inicialmente, uma revisão bibliográfica e um levantamento de notícias sobre a
atuação política das milícias. Posteriormente, foi efetuado um estudo de caso, por meio de observação em
campo, em um bairro sob influência de milícia, localizado em um município da Baixada Fluminense. Essa
observação teve como foco inicial a campanha dos milicianos pela reeleição de um candidato a deputado
estadual e uma candidata a deputada federal em 2022, mas foi expandida para a campanha dos mesmos milicianos
pela eleição do candidato Lula (PT) no segundo turno. O trabalho de campo foi concentrado, sobretudo, em
três grandes eventos: um comício com a presença dos candidatos a deputado e os dois dias de eleições -
primeiro e segundo turno. Para apoiar o trabalho de campo, foram coletados dados sobre as eleições junto ao
TRE-RJ e foi realizada uma observação em redes sociais. Os resultados desta pesquisa indicaram que as
milícias possuem várias formas de atuar politicamente, como o lançamento de candidaturas de seus membros, o
estabelecimento de cooperação com políticos, as restrições a campanhas de candidatos em seus territórios e
até mesmo a intimidação e o assassinato de candidatos rivais. A pesquisa concluiu que a heterogeneidade das
milícias se reflete também nessa diversidade de atuação política e no grau de uso da violência nas eleições.
O uso do clientelismo é mais frequente e determinante para as milícias do que a violência e a coação, mas
estas ainda possuem um papel fundamental para o poder político desses grupos. Por fim, a pesquisa concluiu
que a atuação política das milícias em seus territórios compromete os pilares mais básicos do conceito de
democracia, ao impedir, por exemplo, a livre concorrência entre candidatos e ao utilizar o Estado para
benefício próprio. Ao mesmo tempo, ela compromete também os pilares do conceito de cidadania, ao privar os
moradores do pleno exercício de direitos civis e políticos.