Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
GT 006: Antropologia audiovisual com fotografias e filmes: da película ao digital
Turmalina Paraíba e os olhares possíveis da alteridade na Feira de São Cristóvão
No início do ano de 2003 começamos a filmagem do Turmalina Paraíba, que tem por objetivo registrar um processo de mudança em pleno desenvolvimento: a transformação da Feira de São Cristóvão em Centro Luiz Gonzaga de Tradições Nordestinas, ocorrida em setembro daquele ano. A relevância deste documentário está relacionada à importância cultural e social da Feira de São Cristóvão e ao impacto desse processo de mudança na vida social dos agentes sociais, os migrantes nordestinos, que mantêm uma estreita relação com este espaço na Cidade do Rio de Janeiro. A mudança não foi radical no que se refere à localidade, uma vez que a feira continuou a ser realizada no Campo de São Cristóvão, só que não mais ao redor do Pavilhão de São Cristóvão e sim no seu interior. Contudo, o de fora para dentro, não é um deslocamento espacial desprovido de significações. O lugar, conforme aponta Bourdieu, é definido pela relação entre as estruturas do espaço físico e as do espaço social, assim, estar dentro, em oposição a estar fora, apresenta graduações de uma certa ordem. Esse processo de mudança foi captado pelo filme: a razão da mudança, como foi o processo, quem se beneficia, quem é prejudicado, os prós e os contras, os pontos de conflitos entre os diferentes agentes sociais que estão direta ou indiretamente ligados à feira: feirantes, frequentadores, moradores do bairro, habitantes da cidade e representantes do poder público. As oposições tradição/modernização, primitivo/civilizado e atrasado/desenvolvido são os referenciais teóricos do filme. No ano de 2023 o documentário foi finalizado. Os motivos da demora foram diversos, mas foi compensada pela emocionante primeira exibição, que ocorreu em outubro de 2023, 20 anos após o início das filmagens, na Praça Catolé do Rocha, conhecida como Praça dos repentistas, na Feira de São Cristóvão. Os convidados para a exibição foram os feirantes, artistas e frequentadores que participaram das filmagens, bem como seus familiares e amigos, por conta inclusive de alguns já terem falecido. Se reverem 20 anos depois na tela do cinema, ou verem os familiares ou amigos falecidos, bem como ver a antiga feira e esse processo de mudança foi muito emocionante para o público presente. O filme, que tem uma estética voltada à emoção, bem como sua exibição em um espaço, que é referência de trajetórias sociais, cumpriram a missão que havia sido desenhada desde o início do projeto fílmico: ser a expressão de uma despedida e uma forma de lembrança. Nesse sentido, nosso trabalho traz uma discussão sobre as possibilidades de diálogos sobre olhares postos pela produção fílmica e suas interações com os próprios sujeitos retratados, procurando contribuir com o debate sobre a produção de imagens como suporte privilegiado em pesquisas etnográficas.