Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
GT 087: Práticas espirituais na África e nas Américas
Umbanda Esotérica: afrouniversalismo, multiplicidade religiosa e o encontro entre diferentes e
diferenças em um terreiro de Umbanda
Bianca Zacarias França (UFMG)
Esta pesquisa é resultado de um trabalho etnográfico que se iniciou no ano de 2014, com o Templo
Universalista e Espiritualista Solar TUÉS, terreiro de Umbanda Esotérica parceiro deste empreendimento. O
objetivo é compreender como uma cosmologia tão múltipla, definida pelos umbandistas como afrouniversalista,
atravessa a composição e a topologia de forças de territórios, como o terreiro e o corpo, que são
polarizados pelo gênero, como um organizador ritual, e povoados por seres outros. Exu e o tempo aparecem
como grandes promotores de encontros que cruzam os caminhos linhas de força biográfica dos/das médiuns
com o terreiro, com seus guias, com a cidade, com o mundo, que, no limite, é um grande terreiro-território.
Mostrando-nos que nem tudo que se ajunta se mistura, o estilo pluralista ou politeísta parece dar o tom da
arte de unir a diferença sem se acabar com heterogeneidade nem perder seu pertencimento umbandista. A matriz
afro aqui é entendida como uma perspectiva transformacional, sugerindo que todas as linhas podem fazer parte
de um contínuo heterogêneo e o "universalismo", nesse contexto, não se apresenta como algo
desterritorializante ou universalizante. Esse conceito (afrouniversalismo) funciona como um cavalo de santo
e é ocupado e incorporado por uma perspectiva cosmológica que pode ser aproximada ao que José Carlos dos
Anjos (2006) chama de encruzilhada, se afastando do que superficialmente possa se pensar sobre sincretismo e
mistura de religiosidades diferentes. Pelo contrário, é uma forma de pensar diferenças sem apaga-las ou cair
na mera fusão, o que será pormenorizado ao longo de todo o artigo. As diferentes linhas, entidades e
deidades não são essências identitárias pertencentes a indivíduos, mas territórios simbólicos de
intensidades diversas, passíveis de serem percorridos por multiplicidades de raças e indivíduos (Dos Anjos,
2006, p. 22). Dessa maneira, no terreiro, existem percursos nômades e não-essencializados que não são nem
considerados na arena da identidade nacional (Dos Anjos, 2006).
O terreiro, antes de tudo, é um lugar naturalmente dado aos encontros, e seus habitantes médiuns,
exus/pombagiras, caboclos/caboclas, pretos velhos/pretas velhas, crianças, seres extraterrenos, seres
intraterrenos, seres da natureza são especialistas em uma política cósmica da diferença entre mundos
múltiplos, divergentes e, por vezes, perigosos. Esses seres outros também estão em movimento,
modificando-se, criando sua própria história de vida e, de alguma forma, sendo coetâneos a nós, compondo uma
epistemologia umbandista, que é complexa, reflexiva, formadora de conceitos, teoria, práticas e ontologias
nativas que não são apenas boas para pensar.