Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
GT 013: Antropologia das práticas esportivas e de lazer
Ainda somos aquele país do futebol?: uma análise da produção sobre esportes em artigos de Antropologia Urbana (2006-2023)
"O tempo “em que tudo era mato não mais qualifica o cenário da produção das ciências sociais brasileiras sobre as dimensões do esporte. É notável um crescimento vertiginoso de teses, dissertações, periódicos e dossiês destinados ao assunto nas últimas duas décadas, com destaque para a Antropologia. No entanto, a falta de sistematizações bibliográficas, fato necessário para o refino de qualquer área de estudos, nos impede de aferir se esse crescimento foi acompanhado de uma diversificação de objetos e temas.
De modo a sanar esta lacuna, oferecemos uma análise qualiquantitativa dos artigos de Antropologia Urbana publicados na Esporte e Sociedade e na FuLia/UFMG, duas importantes revistas de Ciências Humanas e esportes cujos catálogos contemplam, com frequência, etnografias. Apoiamo-nos na metodologia de trabalho desenvolvida pelo UrbanData-Brasil (https://urbandatabrasil.fflch.usp.br/), banco de dados fundado no desfecho da década de 1980 pela socióloga Licia Valladares e que, desde então, se consagrou como referência para a pesquisa urbana brasileira. Emprestamos de seus protocolos de classificação, em especial, as Áreas Temáticas, vocabulário controlado que mapeia os trinta e cinco principais temas dos estudos urbanos.
Com a amostra dividida em dois recortes temporais, constatamos que a “monocultura futebolística não sofreu uma derrocada, pois 78,8% dos artigos elegeram o futebol como objeto de investigação. Contudo, transparece entre 2015 e 2023 um alargamento do que se entende por “futebol”; aquele mais “tradicional”, jogado profissionalmente e torcido por homens, passa a conviver com outros (futebol de várzea e de bairro, futebol de mulheres, futebol trans, etc). Nesse sentido, o que se tornou mais diversificado na Antropologia foi o campo de pesquisa em futebol, embora outros esportes, de fato, apareçam. Procuramos, assim, oferecer hipóteses para este fenômeno com base na bibliografia e na emergência de agentes e eventos (a refundação do Campeonato Brasileiro de Futebol Feminino, a criação da Taça das Favelas, a exposição da relação gênero/esportes na mídia, etc).
No que diz respeito às Áreas Temáticas, sublinha-se o aumento acentuado de pesquisas em gênero e, também, sobre os espaços e as infraestruturas urbanas, o que pode estar relacionado com o ciclo de megaeventos e a construção de novos estádios e praças esportivas. Na contramão, chama atenção a escassez de pesquisas sobre relações étnico-raciais, algo incongruente com o legado colonial brasileiro, os casos de racismo ocorridos no mundo dos esportes e as crescentes manifestações de afirmação de identidade, resistência e denúncia. Estes e outros tópicos, portanto, foram tomados de modo a evitar o acúmulo perdulário de informações e oferecer perguntas e caminhos aos pesquisadores da área."