ISBN: 978-65-87289-36-6 | Redes sociais da ABA:
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
GT 079: O visível e o in(di)visível: ciências, conhecimentos e produções de mundos.
Ciências naturais em uma experiência pan-indígena no Brasil Central depois de 1988
Proponho apresentar um dos capítulos da tese de doutorado (em elaboração) acerca do Centro de Pesquisa Indígena (CPI), uma iniciativa da União das Nações Indígenas (UNI) e de professores da Universidade Católica de Goiás (UCG) que abarcou projetos-piloto voltados a combinar conservação ambiental, desenvolvimento socioeconômico de comunidades de diferentes povos e a formação de pesquisadores indígenas nas áreas de Biologia e Direito. A iniciativa ocorreu entre 1989 e 1996 e teve como pilares a tentativa de consolidar um movimento pan-indígena no país, a interseção com o ambientalismo através de ONGs transnacionais, e a transformação da relação entre ciências naturais e povos indígenas. Em 1979, Daniel Gross e colaboradores criaram um modelo para explicar as interrelações entre degradação ambiental e envolvimento de comunidades indígenas no mercado, comparando esse quadro entre os Kayapó-Mekrãgnoti, os Xavante (de Pimentel Barbosa), os Bororo (de Gomes Carneiro) e os Canela (Ramkokamekra), em que sugeriram a irreversibilidade do processo desencadeado pela intensificação da caça, que se tornaria inviável devido à sedentarização forçada pelo avanço da fronteira econômica/agropecuária (Gross et al, 1979). Esse modelo foi contestado por pesquisadores de campo, que enfatizaram características históricas, políticas e cosmológicas da relação entre povos indígenas do Brasil Central e a natureza (SANTOS et al, 2014). Em 1989, uma parceria entre professores da UCG, a ONG Núcleo de Cultura Indígena (da UNI) e a Associação Xavante de Pimentel Barbosa (AXPB) resultou na criação do Projeto Jaburu, voltado ao manejo da fauna cinegética e ao aproveitamento econômico da flora do cerrado, em conexão com o CPI, sediado em uma chácara na região metropolitana de Goiânia. Os projetos obtiveram financiamento de diversas organizações ecologistas internacionais, além do apoio de instituições de pesquisa nacionais, como a Embrapa e a ESALQ-Piracicaba, além de departamentos da própria UCG. Naquele contexto, uma equipe formada por um zoólogo e caçadores Xavante tentou aferir o status de populações de espécies animais silvestres quanto a condições de reprodução biológica e a riscos de extinção local. Outra equipe foi formada para executar o reflorestamento das áreas degradadas pela agropecuária, que os Xavante haviam retomado. Uma terceira equipe foi formada para dar existência a uma fábrica indígena voltada ao beneficiamento de frutos do cerrado. Em meio a sonhos de anciãos Xavante, teorias da conservação, princípios econômicos e utopias sociopolíticas do período da redemocratização do país, os projetos-piloto associaram redes que até então agiam de modo separado, criando conexões parciais entre os atores, que experimentaram a criação e a dissolução da iniciativa.