ISBN: 978-65-87289-36-6 | Redes sociais da ABA:
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
GT 096: Sexualidade, gênero, raça e territorialidades: articulações, pertencimentos e direitos em disputa
Homens quilombolas e negros: narrativas do Eu no mundo acadêmico
É crescente a produção no Brasil de debates públicos e estudos acadêmicos sobre homens e masculinidades negras, seja como um tema central, seja como um tema transversal ou lateral. Embora essa crescente produção mobilize críticas a um senso-comum que concebe a análise sobre masculinidades e homens negros de maneira monolítica, homogênea e essencialista, parte desse debate público e dos estudos acadêmicos apresenta-se sob a forma de narrativas mais autorreflexivas e especulativas e menos como estudos a partir de bases empíricas. Diante deste cenário, pesquisar sobre o tema homens e masculinidades negras, portanto, obrigado-nos a teorizar velhos problemas de maneira que seja possível participar do debate público sobre homens negros criticamente, driblando dicotomias e binarismos que ainda são persistentes quando raça e gênero são articulados (West, 1993; Gray, 1995; Gates JR., 2001). Uma análise sobre como jovens homens negros de espaços não-urbanos passam a viver experiências de racialização em instituições educacionais urbanas, a partir de uma pesquisa realizada entre os anos de 2018 e 2019 em Santarém, Oeste do Pará, com jovens homens quilombolas estudantes da Universidade Federal do Oeste do Pará, é parte do exercício de reflexão sobre dispositivos de diferenciação acionados para a confecção de identidades raciais no ethos urbano. Como esses dispositivos interatuam nas narrativas do Eu feitas por esse sujeitos a partir da vida universitária? Qual é o "Eu masculino" de jovens homens negros quilombolas, estudantes universitários, fora dos territórios de origem? Quais os impactos da sociabilidade na universidade sobre a identificação de raça e gênero dos jovens homens negros quilombolas? Um dos pontos de tensão entre os entrevistados reside nas dificuldades de execução de tarefas e atividades pedagógicas acadêmicas e científicas, vistas como parte das exigências necessárias para que um negro quilombola que está na universidade possa merecer estar e obter respeito dos demais colegas. As dificuldades de adaptação envolvem valores e ideias ora explícitas, ora latentes sobre o lugar do trabalho intelectual como atividade legítima entre homens negros de diferentes origens. Tais valores e ideias ainda inscrevem, subrepticiamente, uma imagem espúria de homem negro brutalizado como expressão negativa de uma disputa entre um anti-intelectualismo e uma valorização da educação como prática de autonomia política. Esta disputa faz parte de conflitos individuais vividos pelos entrevistados, para os quais a universidade passa a se constituir como um vetor ambivalente de autovalorização de percepção de si como um corpo racializado e masculinizado.