ISBN: 978-65-87289-36-6 | Redes sociais da ABA:
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
GT 102: Transições democráticas e controle social: repensando marcações temporais
Até tirar-lhes a vida: uma genealogia do auto de resistência
O objetivo deste texto é o de aprofundar e relativizar as origens históricas do auto de resistência, forma discursiva fundamental para o Estado brasileiro e sua administração, cuja característica distintiva reside na produção de uma narrativa oficial de dizer que um civil só sofreu violência do Estado porque ele reagiu. O auto de resistência, portanto, desempenha um papel crucial na construção da chamada verdade jurídica e na fé pública acerca da narrativa policial. Para a base da nossa apresentação, nos utilizamos de duas técnicas de pesquisa: uma genealogia dos debates públicos sobre auto de resistência num período entre 1830 e 1980 dentro da Hemeroteca Digital Brasileira e uma revisão bibliográfica sistemática acerca de trabalhos acadêmicos brasileiros que mencionam a invenção ou origem do auto de resistência. Apoiando-se em pesquisa documental e inspirado no método genealógico, nesta apresentação, destacaremos duas evidências-chave que fundamentam nosso objeto central: o aumento na cobertura de notícias sobre o tema e o consenso gerado pela leitura do livro de Verani (1996). Sustentamos que, embora o conceito de "auto de resistência" não tenha sido criado nos anos 1960, foi nessa época que ele assumiu um papel central no cenário da polícia que mata. Utilizamos dois argumentos principais para embasar nossa posição. Primeiramente, confrontamos a interpretação de Verani sobre as origens do auto de resistência, ressaltando que tanto os profissionais do direito quanto a imprensa da época o consideravam uma inovação contemporânea para justificar a letalidade policial. Em segundo lugar, exploramos a sua origem nas práticas policiais cotidianas, especialmente ligadas aos grupos de extermínio, e como isso influenciou o surgimento de uma polícia política durante o período pós-1964. Nesse contexto, as fronteiras entre "segurança pública" e "segurança nacional" se tornaram cada vez mais difusas, permitindo a ampliação das atividades criminalizadas sob a narrativa do auto de resistência, utilizando-se da fé pública e da perspectiva do agente de segurança.