Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
GT 009: Antropologia da Economia
Dinheiro da pensão: entre o direito, a necessidade e a moralidade
A presente proposta parte de uma etnografia que articula vida, economia, gênero e favela e traz como foco as tensões, articulações e possibilidades a partir do dinheiro de pensão alimentícia. Em dezembro de 2023, ouvi circulando pela família de minha interlocutora uma fofoca de que ela estaria recebendo R$5.000,00 de pensão alimentícia. Já conhecendo os desdobramentos da luta judicial de Pâmela, minha principal interlocutora em minha etnografia, bem como as fofocas que passam pela família, levantei algumas indagações sobre o valor: “mas ela está recebendo cinco mil? Pensava que fosse menos”. As afirmações sobre o valor continuaram, seguidas de algumas narrativas as quais já havia escutado, tanto pelos familiares, quanto por minha interlocutora. Destas narrativas, os questionamentos sobre o “alto valor” da pensão e o que Pâmela faz com esse dinheiro são corriqueiros.
A partir de uma etnografia dos dinheiros cotidianos realizada com uma família no Complexo do Alemão, conjunto de favelas situada na Zona Norte da cidade do Rio de Janeiro, este trabalho tem como objetivo pensar etnograficamente o “dinheiro da pensão” a partir de seu caráter legal, moral e propriamente financeiro. Viso desdobrar, então, como o dinheiro da pensão, por sua própria origem, desencadeia uma rede de moralidades e disputas. E não apenas sua origem, como também o seu valor intensificam tais redes de fofoca, que se desdobram com questionamentos sobre como Pâmela estaria “sempre enrolada com dinheiro” já que recebe um valor “tão alto de pensão”.
Minha interlocutora hoje recebe R$2.500,00 de pensão alimentícia para sua filha mais velha, fruto de seu primeiro casamento. Após alguns anos de acordo no “boca a boca”, Pâmela percebeu a necessidade de reivindicar um aumento na pensão. De início, tentou negociar o aumento de maneira informal e amigável com o ex-marido, pedindo R$500,00 a mais, proposta negada por ele, que entendia que o valor era “o suficiente” para criar a menina. O embate foi para a justiça e minha interlocutora, após cinco meses, conseguiu um aumento de mil reais, recebendo 13% do salário de seu ex-marido, dono de uma rede de pizzarias na zona norte da cidade.
Ademais, minha interlocutora defende o dinheiro da pensão como um direito não apenas por suas razões legais, mas também por ser ela quem “cuida” do dinheiro e organiza as atividades de manutenção da casa e do cuidado, cujo dinheiro da pensão é enquadrado, aqui, como um “dinheiro certo”, nos termos de Motta (2023). Desse modo, desenvolverei neste trabalho a relação moral perpassada por esta forma de rendimento, bem como as estratégias que são construídas a partir de sua regularidade.