ISBN: 978-65-87289-36-6 | Redes sociais da ABA:
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
GT 080: Ontologia e Linguagem: línguas indígenas, artes verbais e retomadas linguísticas
Os sons e os outros : reflexões sobre a cosmo-ecologia nadëb no Noroeste Amazônico
Proponho neste trabalho uma discussão sobre os cantos e benzimentos do povo Nadëb e analiso a maneira pela qual o regime sonoro e a arte verbal indígena compõem (e estruturam) um sistema de relações interespecíficas que chamo de cosmo-ecologia na região do alto Uneiuxi, na Bacia do Rio Negro (AM). Para isso, apresento algumas transcrições e traduções do repertório de cantores-xamãs que pude registrar durante pesquisa de campo (2016-2019), bem como suas reflexões sobre o tema. Os Nadëb são um dos quatro povos falantes de línguas da família Naduhupy, ao lado dos Hupd’äh, Yuhupdeh e Dâw. Atualmente, todos eles habitam o Noroeste Amazônico, majoritariamente em território brasileiro. Na literatura especializada da região, estes povos são geralmente caracterizados pela alta mobilidade espacial e por terem vivido, até um passado recente, principalmente em regiões de cabeceiras de igarapés no interior da mata. Nesta apresentação, começo por destacar a importância do regime sonoro para a cosmologia nadëb e discuto de que modo ele está ligado à gênese e à (re)produção da vida, humana e não humana. Na sequência, apresento e analiso os cantos tradicionais nadëb (nadëb jäm) e as fórmulas verbais xamânicas (mehëm) regionalmente referidas como benzimentos. Discuto, então, de que maneira o repertório indígena se encaixa neste universo. Há um conjunto de termos presentes na arte verbal nadëb que é particularmente relevante para a discussão: häd had'yyt, os nomes legítimos de cada ente. Tais componentes, quando manipulados adequadamente por especialistas (cantores- xamãs), podem agir sobre os diferentes planos cósmicos. Um segundo movimento que proponho neste trabalho é o de esboçar aproximações e contrastes entre elementos presentes no repertório nadëb em comparação a um certo padrão da arte verbal xamânica rionegrina. Ao propor tais discussões, almejo chegar a uma caracterização do repertório sonoro tradicional nadëb ao mesmo tempo em que procuro analisar sua relação com o problema fundamental da reprodução humana, da produção do parentesco e de corpos.