ISBN: 978-65-87289-36-6 | Redes sociais da ABA:
Trabalho para RC - Roda de Conversa
SE 05: Antropologia visual, re-existências e mundo porvir
Artes de notar, saberes e manejos coletivos de aquíferos e outros corpos d'agua
Há algum tempo a antropologia vem “olhando para as águas” e estudando as infraestruturas que permitem - ou não - que ela chegue até a casa das pessoas. Nestas pesquisas sabemos sobre como as pessoas organizam seu cotidiano em torno dos cuidados com a água, sobre as políticas estatais para o abastecimento, sobre as paisagens e a presença de seus diversos corpos d’água. Aqui apresento a pesquisa que realizamos com alguns dos sistemas coletivos alternativos de abastecimento de água de Florianópolis, Santa Catarina e que resultou no documentário “Águas Alternativas”. Estes sistemas são administrados por associações de moradores e ganham existência na combinação entre as práticas das pessoas e as particularidades do revelo, das águas e seus fluxos, das condições ambientais de cada comunidade. Desde 2021 acompanhamos o cotidiano e a história de algumas dessas associações que se tornaram uma alternativa qualificada no abastecimento de água na cidade. Um profundo conhecimento da paisagem, dos caminhos dos morros e dos fluxos da água nestas regiões orienta as práticas destes moradores, bem como suas negociações entre vizinhos e com o poder público para se manterem como sistemas alternativos. Com os cuidadores das águas, seguimos seus fluxos: brotando nas nascentes; descendo os morros; encanada e distribuída; tratada e acumulada nos reservatórios; correndo nos hidrômetros e torneiras; escorrendo pelos bueiros e infiltrando no solo, com a chuva. Tais práticas de manejo são relatadas como “cuidar da água”, “arrumar a água”, “arrumar a cachoeira”, “plantar água”, por pessoas encarregadas da manutenção e gestão desses sistemas, em que o uso de uma série de aparatos e de relações indiretas com a vizinhança, com a cidade e com a bacia hidrográfica local se revelam. Ter atenção aos ciclos das chuvas e aos períodos de maior estiagem ou cheia, observar as diferenças entre mananciais subterrâneos que exigem ponteiras e poços ou aqueles derivados de nascentes que “brotam” do chão e demandam práticas de contenção de volumes d’água, são elementos comuns do manejo destes sistemas e das artes de notar a paisagem destes cuidadores. Cada uma destas formas de se relacionar com o sistema de abastecimento local nos desafiou a olhar e escutar a água em suas relações com o chão, os canos, a gravidade, a atmosfera, as torneiras. Nos desafiou a acompanhar as artes de notar destas pessoas e pensar sobre as formas de expressar em vídeo e som estas relações. No documentário, as narrativas dos cuidadores abastecem a história de suas comunidades. As imagens seguem enunciações das águas na paisagem. A paisagem sonora evoca suas traduções: bruta na captação, bombeada, filtrada, reservada, tratada, cuidada. Esta pesquisa contou com financiamento da FAPESC e apoio do INCT Brasil Plural.