Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
GT 098: Som, música e eventos: experimentações etnográficas
A mimese ritual à cidade sagrada: o poder das recitações em uma confraria sufi transnacional.
O artigo explora as dimensões das ações devocionais realizadas pela confraria senegalesa Muridiyya no
município de Niterói (RJ). No que diz respeito às doutrinas do campo ritual, a maioria dos discípulos
considera o valor da submissão, o amor pelo santo patrono, a leitura dos poemas religiosos (qasidas) e a
oferta de dinheiro mais importantes do que a recitação diária das litanias. Além disso, durante a prática
das invocações dos nomes e da presença de Allah (dhikrs), é importante destacar as relações entre os
fenômenos de santidade, profecia e milagres provenientes dos santos, considerados homens protegidos e
honrados por Allah. A maioria dos discípulos e portadores de narrativas orais empenham-se em comprovar a
santidade dessas figuras mais proeminentes. No entanto, essas hagiografias estão sempre sujeitas a edições e
remodelações, ou seja, elas não constituem uma organização homogênea com uma história linear e isenta de
conflitos. Ao contrário da suposta capacidade do ritual de conectar lugares distantes por meio da atuação de
imaginários transnacionais, argumento que tanto as qasidas quanto os dhikrs buscam renovar as experiências
de seus participantes por meio da ação mimética com a cidade de Touba, local que abriga o mausoléu de Shaikh
Ahmadou Bamba Mbacke (1853-1927). A produção de dados sobre o cotidiano religioso deste grupo sufi foi
viabilizada por meio de um trabalho de campo realizado durante o Ramadã (mês sagrado para os muçulmanos) em
2023, contemplando algumas visitas aos locais de encontro do grupo em fevereiro de 2024. As experiências
etnográficas tiveram como base as reuniões de discípulos da Muridiyya, organizada na associação local
(dahira) e frequentada por senegaleses da etnia Wolof. As observações diretas sobre a vida ritual sufi foram
complementadas com conversas informais, a fim de obter acesso ao fluxo interpretativo dos adeptos e
confrontar as informações provenientes dos interlocutores com outros contextos etnográficos já
desenvolvidos. O uso de equipamentos, como mesa de som, microfones e alto-falantes, juntamente com a
reprodução de CDs contendo recitações ao santo patrono, criava uma paisagem devocional mimética com o local
sagrado da confraria. Além disso, essas ações evocavam uma cenografia religiosa compatível com as aspirações
dos envolvidos. Tais performances sonoras (recitações feitas no local e/ou gravadas), combinadas com as
perspectivas exigidas pela ortodoxia local, recriavam os imaginários dos adeptos.
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