ISBN: 978-65-87289-36-6 | Redes sociais da ABA:
Apresentação Oral em Grupo de Trabalho
GT 082: Para além do CEP/Conep: desafios e reflexões sobre ética na pesquisa antropológica
Qual é o seu "n"? A Plataforma Brasil e um encontro conflituoso entre burocracia, ética e lógicas de produção do conhecimento
No Brasil, a burocracia de regulação da pesquisa é feito por meio do sistema CEP/CONEP, formado pela rede de Comitês de Ética em Pesquisa (CEPs) ramificada pelo país e centralizada em Brasília pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep), vinculada ao Ministério da Saúde. Esse sistema é operacionalizado por meio da Plataforma Brasil, um portal destinado a receber, protocolar e tramitar todo o processo de avaliação ética de um projeto de pesquisa. Assim como ocorre em outros países, essas burocracias produzem e impõem a diversas áreas do conhecimento regulamentações baseadas nos princípios particulares e na pretensão universalista da bioética, orginalmente concebidas e certamente mais pertinentes para o controle dos riscos de pesquisas clínicas e experimentais no campo da biomedicina. Sendo assim, os debates acadêmicos sobre os desafios práticos e epistemológicos que surgem a partir desses encontros/desencontros expressam tanto um conflito de éticas quanto disputas de autoridade entre os saberes biomédicos e os das Ciências Sociais e Humanas (CSH). Levando essa questão em consideração, esse paper discute a tensão entre os diferentes modos de produzir conhecimento e de conceber os procedimentos éticos e metodológicos desses dois campos vivenciada em uma interação que tive com a coordenadora (uma médica) da área de pesquisa de uma instituição da cidade de São Paulo para apresentar um projeto de pesquisa. O projeto, que foi redigido de acordo com uma série de imposições da Plataforma Brasil que não fazem sentido para uma pesquisa etnográfica, já havia sido submetido ao CEP da universidade e tinha sido aprovado. No entanto, mesmo tendo preenchido satisfatoriamente as exigências ético-burocráticas, o projeto foi extremamente mal recebido por minha interlocutora. A partir dessa cena – que chamo de um encontro conflituoso –, busco discutir de que maneira a incorporação da etnografia e de outros métodos de pesquisa de caráter qualitativo em pesquisas sobre saúde têm provocado discussões e atritos que colocam em xeque a hegemonia do campo biomédico e suas lógicas de produção do conhecimento.