Redes sociais da ABA:
Logo da 30ª Reunião Brasileira de Antropologia
3 a 6 de agosto de 2016
João Pessoa - PB
UFPB - Campus I
GT 005: Antropologia da Criança
Apresentação Oral em GT
Rafael Rondis Nunes de Abreu, Silvana Jesus do Nascimento
A culpa é da cultura? Uma análise crítica da cobertura midiática do caso dos "indiozinhos"
Neste work pretendemos discutir os usos e efeitos políticos de um dos conceitos mais antigos da antropologia, “cultura”, a partir da sua circulação e legitimidade fora dos debates internos à disciplina. Tomamos como material de análise uma série de 17 textos jornalístico publicados, entre 21 de janeiro de 2016 à 26 de fevereiro de 2016, por um dos principais jornais de circulação virtual de Mato Grosso do Sul, no Brasil. O protagonista das notícias foi um menino indígena, que não teve a etnia na qual ele pertence divulgada, Edemar Gonçalves da Silva, de 4 anos, apelidado pela imprensa local de "indiozinho". A breve e intensa espetacularização da história pessoal da criança, da família e a acusação de omissão por parte de outros órgãos de atendimento ao indígena ocorreu enquanto este estava na Santa Casa em situação de internamento social, para ser submetido a uma cirurgia cardíaca. As narrativas construídas e veiculadas pelo jornal culpabilizaram a "cultura", que de acordo com a jornalista, poderia matá-lo, pois era um entrave para a realização da operação cardíaca. Em um dos textos o jornal reproduz fragmentos de uma carta do pai da criança que teria proibido a operação, sob o argumento de que o "coração é sagrado". Em meio à exacerbada exposição da história e da imagem da criança, apareceram, nas matérias, opiniões divergentes de familiares e profissionais de diversas áreas, inclusive de antropólogos cujas participações foram utilizadas para corroborar com o argumento da “cultura como problema”. A análise dos discursos presente nos jornais será cruzada com entrevistas com as personagens citadas nas notícias, com profissionais e instituições que tiveram contato com a criança e com a sua parentela, assim como os próprios parentes serão ouvidos. O objetivo é trazer para o bojo da discussão a atuação dos profissionais envolvidos neste caso específico, principalmente aqueles ligados à imprensa, a saúde pública e à assistência social, com o intuito de refletir sobre a atuação das distintas áreas frente à criança indígena. Um dos resultados a que chegamos a partir deste caso é que o processo de visibilização da criança indígena acompanhada do conceito de “cultura” tem o efeito de sensibilização para o sofrimento infantil, mas também de controle e de violência contra as “práticas culturais” dos povos indígenas. Com esta reflexão pensamos ser possível avançarmos no debate em torno das disputas políticas feitas pela e em nome da criança, além dos efeitos da criação de uma comunidade emocional em torno da criança vítima.