GT 051. Performances e marcas da religião na cidade
Apresentação Oral em GT
Paola Lins de Oliveira
Performances, marcas e ruínas da cidade no sagrado transgressor de Linn da Quebrada e Baco Exu do Blues
Linn da Quebrada, artista multimídia, lança em 2017 o álbum Pajubá combinando rap e funk. No mesmo ano, Baco Exu do Blues, nome artístico de Diogo Moncorvo, cantor, rapper e compositor, lança seu primeiro álbum solo, Esú. Os nomes prefaciam alguns dos seus sentidos sagrados: Pajubá é um vocabulário combinando língua portuguesa e línguas africanas usado por praticantes de religiões afro-brasileiras e pela comunidade LGBT; Esú é a grafia de Exu em Iorubá, orixá associado à comunicação, à encruzilhada. Os sinais sagrados se multiplicam em diversas músicas dos álbuns. Entre versos contundentes que denunciam o extermínio das travestis e transexuais (“Baseado em carne viva e fatos reais/É o sangue dos meus que escorre pelas marginais” – Bomba pra caralho), e que afirmam a importância do enfrentamento (“ser bicha não é só dar o cu é também poder resistir” – Muito talento), Linn aborda o sagrado em Blasfêmea, título do clipe da música Mulher. Nele, performa uma travesti em becos escuros. A voz em off recita: “De noite pelas calçadas/Andando de esquina em esquina/Não é homem nem mulher/É uma trava feminina/Parou entre uns edifícios, mostrou todos os seus orifícios/Ela é diva da sarjeta, o seu corpo é uma ocupação/É favela, garagem, esgoto”. Em uma entrevista, a artista explica: “blasFêmea é um ato profano de ocupação e invasão”. Trazendo Exu no nome, combinado com o deus romano do vinho e da festa, Baco Exu do Blues mescla mitologias afro-brasileiras, romanas e nórdicas para falar de vida, morte, divino, humano, racismo, violência, sexo e amor. É nas ruas da cidade que Baco vive parte das experiências que traz em suas músicas. Nelas, canta o torpor da vida minada pelo racismo (“Todo morto é negro/Vocês são cegos/Meu som é o braile do gueto” – Abre Caminho); a sede de justiça culminando em um juízo final (“Vi os prédios subindo/A mata acabando/Aproveitei e arranhei o céu/ Vi minha raça sumindo/Vocês nos matando/Aproveitei e levei todos pro céu” - idem), entre outras referências. Na canção que dá nome ao álbum, Baco anuncia a autosacralização pela via do temor (“Sinto que os deuses têm medo de mim/Medo de mim/Metade homem, metade deus e os dois/Sentem medo de mim [...]/ O mundo é fruto da nossa imaginação/ Será que somos deuses ou sua criação” – Esú). É nas ruas que Linn e Baco vislumbram a morte, a violência, o risco de aniquilação. Nelas experimentam o medo e também o desejo, ao mesmo tempo em que inspiram medo e desejo, acionando o mecanismo de atração e repulsão de um sagrado ambíguo e transgressor. É também na rua que vivenciam uma potência transgressora e blasfema que os impulsiona à resistência e re-existência. A proposta é recuperar os contornos desse sagrado contrahegemônico que emerge principalmente no espaço urbano, à margem do sagrado hegemônico.