Redes sociais da ABA:
GT 040. Fronteiras, saúde, gênero e sexualidade: conexões, deslocamentos e alteridades corporais, espaciais, temporais
Apresentação Oral em GT
Pedro Henrique Azevedo da Silva Paiva, Elcimar Dantas Pereira
“Cidade pequena não dá pra travesti, é só fumo”: o ambiente urbano e a performatização da identidade travesti
Com expectativa de vida de 35 anos de idade, residindo no país com os maiores índices de mortes motivadas por transfobia no mundo e com a prostituição sendo a principal atividade remunerativa para cerca de 90% das travestis, estas performatizam suas identidades no território brasileiro. A partir da pesquisa de campo etnográfica realizada com quatro travestis entre julho de 2015 e setembro de 2017, nos moldes da antropologia social com base na observação participante, refletimos como o ambiente urbano influencia na performance identitária das travestis na cidade de Mossoró/RN. Tendo por base as concepções sociológicas de urbanidade (SIMMEL, 1967; WIRTH, 1967) atreladas à ideia de indiferença e de antipatia para/com o/a outro/a, de liberdade como essencial, de solidão e de um lugar cujos indivíduos são socialmente heterogêneos, bem como entendendo que é através das relações sociais do cotidiano que se faz a cidade estudada pela antropologia (AGIER, 2011), é que as travestis se situam e demarcam um território citadino cuja sua travestilidade é performatizada, ou seja, concomitantemente elas “se fazem” na e fazem a cidade, ocupam e constroem uma territorialidade ao mesmo tempo em que delineiam suas identidades. É no ambiente urbano que as travestis veem mais alternativas, através de uma gama de oportunidades mais ampla que a cidade propicia, de construírem seus corpos, suas performances, seus deslocamentos, suas redes de sociabilidade com outras travestis e, sobretudo de conseguirem elencar/concretizar objetivos no plano das relações afetivas e da estabilidade financeira. A afirmação de Paola, uma das interlocutoras, quando diz que a “cidade pequena não dá pra travesti, é só fumo” (fumo, no pajubá, significa armadilha, uma cilada, é insistir em algo que não dar certo) fortalece intensamente a associação de travestilidade com a urbanidade e desse encontro germinam Projetos (VELHO, 1981) que intersecionam a prostituição e a afetividade, pois quando as travestis falam em oportunidades na cidade diz respeito principalmente ao work e este é, no caso delas, atrelado ainda veemente à prostituição, contudo, outros projetos surgem sob o prisma da inserção social das travestis na contemporaneidade, oportunizando outras mobilidades. As travestis significam e simbolizam a cidade - em seus lugares, fluxos e ritmos - enquanto localidade do urbano que territorialmente tem influência protuberante em suas performances. No entanto, é através da ideia de que há uma fluidez e descentramento da performance identitária travesti, que esta pode ser experienciada em qualquer localidade cujas pessoas reivindiquem tal identidade sem ter que corresponder a todo o conjunto de signos e símbolos sociais que essa performance pressupunha em territórios entendidos como hegemônicos.