GT 009. Antropologia da Criança: conjugando direitos e protagonismo social
Apresentação Oral em GT
Marcos Vinicius Malheiros Moraes
“Abrasileirar o Brasil” a partir das crianças: a pesquisa em arquivos sobre a emergência de uma infância na cidade de São Paulo nas primeiras décadas do século XX
O objetivo deste work é discutir aspectos metodológicos do exercício etnográfico no arquivo, pensando sobre como pode ser feita sua apropriação na pesquisa antropológica de modo a destacar a atuação das crianças na análise da emergência de uma infância na cidade de São Paulo nas décadas de 30 e 40 do século XX, considerando dois contextos sócio-históricos: os parques infantis e as trocinhas. Os primeiros foram criados em 1935, quando Mário de Andrade era diretor do Departamento de Cultura e Recreação da cidade de São Paulo, e eram voltados à educação e recreação das crianças provenientes das classes trabalhadoras, em geral descendentes de imigrantes (Faria, 2002), tornando central, para Mário de Andrade, a questão de “abrasileirar o Brasil”; já as trocinhas eram grupos de brincadeira formados por crianças que se reuniam nos bairros centrais da metrópole em formação, tais grupos despertaram o interesse de Florestan Fernandes (2004), que analisou, a partir de pesquisa de campo realizada em 1941, seus aspectos folclóricos e sociológicos. Esses contextos podem indicar como a criança e sua educação tornaram-se cruciais às discussões sobre nacionalidade e modernidade empreendidas por artistas, educadores e cientistas sociais nas primeiras décadas do século XX, instituindo a nacionalidade como dispositivo de saber-poder que constitui, por meio de discursos e práticas, sujeitos e objetos (Foucault, 2010). Para evitar a compreensão da criança como ser passivo neste processo sócio-histórico, faz-se necessária uma reflexão metodológica que indague, em primeiro lugar, o que é um arquivo e como sua análise pode ser feita (Castro, 2008), sobretudo em uma antropologia que considere a criança como ator social e produtora de cultura (Cohn, 2005). Com o intuito de guiar a elaboração de uma etnografia no arquivo, serão analisados três tipos de fontes documentais: textos, fotografias e desenhos. Para enfatizar a atuação das crianças, a análise dessas fontes buscará: (1) efetuar uma leitura a contrapelo dos textos, a qual apresente sua polifonia, isto é, as diversas falas que o autor procura organizar em sua composição (Clifford, 2008); (2) analisar indícios, presentes nas fotografias, da perspectiva das crianças sobre o mundo sócio-histórico, pois a imagem fotográfica instaura um inconsciente óptico (Benjamin, 1994), com elementos que escapam à intencionalidade do fotógrafo, contribuindo para sua polissemia; e (3) destacar como os desenhos - entendidos como produção cultural (Gobbi, 2004) - das crianças dos parques infantis são significativos não apenas como sintoma de um desenvolvimento psicológico, mas, sobretudo, como performance que transforma os sentidos das experiências dos atores envolvidos no processo social em curso na instituição (Turner, 2005).