GT 009. Antropologia da Criança: conjugando direitos e protagonismo social
Apresentação Oral em GT
Leticia de Luna Freire
Viver entre ruínas: remoção e direito à cidade da perspectiva das crianças da favela Metrô Mangueira, RJ
Este work consiste em um recorte do projeto de pesquisa que vimos desenvolvendo, desde 2016, na Faculdade de Educação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), com o objetivo de investigar os efeitos dos processos de mobilidade residencial forçada, em particular aqueles relacionados à realização dos megaeventos esportivos na capital fluminense, sobre a experiência escolar de crianças das famílias atingidas e matriculadas em instituições públicas de ensino fundamental e médio.
Embora se oriente pela perspectiva antropológica, priorizando o ponto de vista das crianças sobre suas próprias experiências, o projeto busca fortalecer o diálogo entre distintos campos disciplinares (antropologia urbana, antropologia da criança, sociologia urbana, sociologia da educação, urbanismo, etc.), assim como a combinação de diferentes metodologias de pesquisa qualitativa (work de campo de caráter etnográfico, entrevistas, realização de oficinas, percursos comentados, etc.).
Mais especificamente, apresentamos alguns resultados da pesquisa em desenvolvimento na favela Metrô Mangueira, situada na Zona Norte da cidade, vizinha ao Estádio Mário Filho, à estação de metrô Maracanã e à própria UERJ, com o intuito de analisar o ponto de vista dessas crianças sobre o processo de remoção quase total das moradias levado a cabo pela prefeitura entre os anos de 2010 e 2016, no bojo de um projeto de renovação da região com vistas à realização da Copa do Mundo e dos Jogos Olímpicos.
Inspirados no livro “Como as crianças vêm a cidade” (1995), escrito por uma equipe interdisciplinar a partir de material produzido pelas crianças de um bairro carioca que sofria um processo radical de renovação urbana, partimos do pressuposto de que as crianças da favela são “usuárias competentes da cidade”. Desse modo, buscamos valorizar suas narrativas, produzidas sobretudo em oficinas realizadas pela equipe do projeto, a fim de apreender como elas vivenciaram e atribuem sentido ao processo de remoção e à sua inserção na cidade, mas também como tais construções simbólicas se refletem na sua vida cotidiana, familiar e escolar. Não buscamos, porém, falar dessas crianças sem nos despir de um lugar de autoridade e poder sobre elas nem sem entender os significados de ser “criança” nesse lugar, mas concebê-las como sujeitos capazes de criar seu próprio sistema simbólico e sua visão de mundo sobre a favela e o direito à cidade, abordando questões pouco exploradas pelos estudos urbanos. Como muitos works produzidos na área de “Antropologia da Criança” tem evidenciado, estudar a criança é importante, por sua vez, tanto por ela expressar o que os adultos normalmente não o fazem quanto por fazê-lo de forma distinta, revelando uma dimensão sensível particular da constituição da cultura.