GT 002. A contribuição da perspectiva antropológica sobre o uso de substâncias psicoativas para o debate atual em torno das
Apresentação Oral em GT
Luana Almeida Martins, Frederico Policarpo de Mendonça Filho
“Dignidade”, “doença” e “remédio” Uma análise da construção médico-jurídica da maconha medicinal
Este artigo surgiu a partir de uma pesquisa em andamento que se interessa em compreender de que maneira a maconha medicinal tem ganhando espaço no Brasil, sobretudo no Rio de Janeiro, tanto no que diz respeito aos ativistas que a defendem quanto em relação a médicos, juízes, promotores, advogados e demais atores que têm sido interpelados a debater e atuar em casos em que o uso medicinal é referido. Neste artigo específico, o foco está no judiciário e na medicina, partindo do pressuposto que não se pode falar em uso medicinal de maneira abstrata, mas sim em uma construção de um uso específico de uma substância, diferenciado de outros – como o recreativo ¬–, por determinados sujeitos, em determinados contextos.
Para esta análise, nosso recorte são os casos que chegaram à justiça por meio de um pedido de um salvo conduto para cultivo caseiro da maconha para fins medicinais, por meio de um habeas corpus. A questão se estrutura partindo da compreensão de que não há um uso medicinal que não seja construído enquanto tal, e o objetivo deste artigo é descrever como este uso tem se estruturado a partir dos discursos médico-jurídicos. Para isso, em termos metodológicos, fazemos uso de entrevistas com juízes e médicos que atuaram nesses casos, de forma a descrever o que eles compreendem por uso medicinal.
Uma categoria central que utilizamos para essa reflexão é a dignidade, tendo em vista que o uso medicinal tem sido justificado judicialmente em referência ao “princípio da dignidade da pessoa humana”. Além disso, para ter acesso jurídico ao uso medicinal, é preciso ser doente, e para que isso seja construído, é necessário ter uma prescrição de um médico que receite a maconha para o tratamento de uma doença. Nesse ponto, observamos a interlocução do discurso médico com o discurso jurídico, no sentido de que são estes que vêm legitimando a concessão do salvo conduto para o cultivo caseiro da maconha.
Como o judiciário legitima um uso em detrimento do outro? Quem são as pessoas dignas ao uso medicinal? Que doença pode ser tratada por intermédio do uso da maconha? São estas questões que orientam as reflexões que serão expostas no artigo.