GT 002. A contribuição da perspectiva antropológica sobre o uso de substâncias psicoativas para o debate atual em torno das
Apresentação Oral em GT
Sandra Lucia Goulart
O nixi pae dos Huni Kuin: reflexões sobre arte e experiências com psicoativos
Esta apresentação tem como tema algumas manifestações artísticas atuais que se relacionam com as tradições da bebida psicoativa ayahuasca (nixi pae) dos indígenas Kaxinawa, mais recentemente autodesignados Huni Kuin, povo que habita uma região de fronteira entre o Brasil e o Peru. Destacamos particularmente o caso do MAHKU - o Movimento dos Artistas Huni Kuin. Ele foi idealizado pelo Huni Kuin Ibã Sales, mas se desenvolveu a partir da parceria deste indígena com o educador Amilton Mattos. O MAHKU nasce como um movimento de traduções de linguagens, quando Ibã Sales passa os cantos do nixi pae para a escrita e para um gravador (áudio), e posteriormente, os traduz para desenhos e pinturas figurativas, começando a transmitir para jovens Huni Kuin novas técnicas de desenho das narrativas míticas do nixi pae. As obras do MAHKU abarcam, também, registros audiovisuais e uso do meio digital. Além disso, o MAHKU tem elaborado obras multimídia em conjunto com artistas não-indígenas ligados à arte conceitual. Este movimento adquiriu projeção internacional, se inserindo no circuito global de arte contemporânea. Os murais do MAHKU, expostos em museus e galerias de vários lugares do mundo, manifestam mediações entre lógicas indígenas e concepções não-indígenas, tais como: magia, seres ecantados, tradição, produção coletiva e interespecífica (do universo indígena); e técnica, arte, artista, autoria subjetiva (do campo artístico ocidental). Argumentamos que o MAHKU está alinhado a dinâmicas e processos mais amplos, que vem ocorrendo em todo o mundo. Nesse cenário, a participação de indígenas no circuito da arte contemporânea tem sido frequente, e parece se relacionar a ações e estratégias de reconstrução étnica e de reconhecimento social destes sujeitos. Este tipo de ação tem assumido relevância, também, em movimentos étnicos de demais minorias políticas. Entendemos que todo esse conjunto de fatos aponta para, em primeiro lugar, um maior destaque da cultura nas ações políticas e, em segundo lugar, para uma recorrência mais constante das linguagens midiáticas das sociedades complexas nestas ações. Nesta comunicação refletiremos como um psicoativo (nixi pae), usado num contexto indígena, pode se transformar num importante agente de atuais mobilizações étnicas e políticas de minorias, possibilitando traduções e mediações entre diferentes linguagens e perspectivas: das sociedades complexas modernas e das sociedades tradicionais.