GT47: Igualdade Jurídica e de tratamento: etnografias de narrativas, produção de provas, processos decisórios e construção de verdades
Apresentação Oral
Glaucia Fernanda Oliveira Martins Batalha
PROCESSOS EM SEGREDO DE JUSTIÇA E AS BARREIRAS NO CAMPO ETNOGRÁFICO: reflexões sobre disputas no jogo das ações de alienação parental
Este trabalho é fruto de inquietações surgidas durante a pesquisa de campo em meio a processos de alienação parental, objeto do trabalho de tese ainda em desenvolvimento. Na pesquisa antropológica quando o campo escolhido é o sistema de justiça invariavelmente o trabalho empírico recorrerá aos processos. É o caso dos processos de alienação parental onde os documentos envolvidos são tecnologias de produção de verdades e de categorização de indivíduos, pois objetiva identificar a figura do alienador que supostamente interferiria de forma promovida ou induzida "na formação psicológica da criança ou do adolescente para que repudie o genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este" (art. 2º da Lei 12.318/2010). Nesta perspectiva, nos interessa investigar se os documentos envolvidos nesses processos contribuem para a produção de sujeitos generificados por meio de disputas em torno da produção de verdades. Nos interessa analisar se o processo de alienação parental se desenha demarcando lugares sociais do gênero e contribuindo para a manutenção das relações de poder, da dominação do masculino sobre o feminino e do viés heteronormativo. Contudo, alguns entraves à nossa investigação etnográfica se apresentam de maneira enfática e desafiadora e vão além da desconfiança do judiciário quando a pesquisa se relaciona às questões de gênero. Dentre eles o fato dos documentos produzidos nesses processos serem permeados pelo segredo de justiça decorrente do direito à intimidade das famílias. Entretanto, cabe problematizar tal "confidenciabilidade" a partir da constatação de que as decisões judiciais tomadas em segunda instância - aquelas produzidas pelos desembargadores de forma monocrática ou colegiada - são publicizadas pelos bancos de dados dos Tribunais de Justiça, sendo preservado apenas os nomes dos menores em iniciais, mas os nomes dos demais membros da família são visíveis. Isto é, a instituição que "guarda" o segredo é a mesma que, paradoxalmente, expõe. Ademais, hoje os documentos jurídicos de primeira instância -aqueles produzidos nas varas de família- não são mais "arquivados" fisicamente, mas por meio do Processo Judicial Eletrônico- PJe, o que torna o acesso aos processos de alienação parental complexo e dependente de uma rede de vínculos prévios como credenciais de permissividade. Os pontos elencados, são alguns dos entraves encontrados nesse campo de estudo, que estão permeados de disputas de poder. Considerando que há poucos aportes na bibliografia clássica que versem sobre as possibilidades analíticas e metodológicos de etnografias com/dos documentos em segredo de justiça, entendemos que evidenciar as barreiras nas investigações antropológicas é uma forma de encontrar caminhos teórico-metodológicos alternativos.