GT13: Antropologia Digital: processos, dinâmicas, usos, contra-usos e contenciosos em redes socioténicas
Apresentação Oral
Lorena Mochel
Hashtags e Testemunhos: trajetos do sofrimento entre mulheres evangélicas no WhatsApp
Neste trabalho, fruto do recorte de minha tese de doutorado em andamento, reflito sobre como mulheres de diferentes denominações evangélicas agenciam sofrimentos formando coletividades no WhatsApp. A pesquisa etnográfica se realizou em um ministério não vinculado ao espaço físico e institucional de uma igreja, sendo formado por um casal de pastores negros e pentecostais, mulheres que residem em regiões periféricas de cidades da região sudeste, além de brasileiras migrantes na Europa. Através de um cotidiano que envolve grupos de oração no WhatsApp e a realização de eventos itinerantes voltados para evangélicas, a análise incitou questões a respeito de dois âmbitos da relação com o digital; de um lado, a presença dos smartphones na reformulação de carreiras pastorais autônomas e, do outro, as estratégias elaboradas por estas mulheres para lidar com sofrimentos, em grande medida atravessados por violências no âmbito conjugal. Meu enfoque será no segundo plano analítico, cujo objetivo é compreender como os usos do WhatsApp nesse ministério criam e transformam redes de cuidado femininas. Se, conforme afirma Fewkes (2019), o caráter de ubiquidade, facilidade de acesso e privacidade são características dos aplicativos móveis que propiciam seus usos religiosos, tais engajamentos no WhatsApp podem ser entendidos enquanto formas de publicizar intimidades de modo seguro e em conformidade com as sensibilidades da ética virtuosa. O caráter interdenominacional e baseado no acolhimento de mulheres de diversos credos torna este um espaço de convívio cotidiano paralelo às igrejas. Enquanto mídia digital, o WhatsApp agrupa narrativas em primeira pessoa que concorrem com outros modos online e igualmente generificados de produzir enfrentamentos no espaço público. Desse modo, cabe perguntar: Que tensões e disputas percorrem engajamentos que não se adequam ao ideal liberatório? De que maneiras a publicização de intimidades através dos grupos no WhatsApp formam ministérios? Em que medida estas coletividades dialogam e disputam com enfrentamentos produzidos nos "feminismos hashtags" (Almeida, 2019)? Como contar testemunhos pelo WhatsApp cria e transforma modos de falar sobre o sofrimento? Ao contrário de perspectivas que identificam o acesso ao divino como solução que fornece respostas fáceis e imediatas para aplacar o sofrimento, as relações digitais estabelecidas com Deus são desenvolvidas através de complexas experiências de "coletividades imaginadas evangélicas" (Sant"ana, 2017). Circular orações, pregações e testemunhos por mensagens de textos e de voz no WhatsApp são dispositivos que, no sentido foucaultiano, acionam disputas no pentecostalismo por coletividades femininas que se engajem no trabalho de "ritualização e (re)narração do sofrimento" (Das, 2020).