GT10: Antropologia das Mobilidades
Apresentação Oral
Fernanda de Gobbi
"Os agiotas ficam sempre por aí": algumas considerações sobre a "dinheiro na rua" da prática de agiotagem popular na cidade de São Paulo
O presente trabalho se inscreve na literatura emergente que analisa as transações informais-ilegais que compõem mercados legais e ilegais, em diferentes escalas, debate que vem sendo construído contemporaneamente no Brasil. A proposta aprofunda analiticamente uma pesquisa etnográfica sobre a prática de agiotagem popular na cidade de São Paulo, e tem como proposta central discutir as histórias das dívidas e conectar biografias, trajetórias e os caminhos do dinheiro em diferentes escalas. Nessa pesquisa, a história das dívidas em andamento é minha unidade analítica. Em torno desse histórico, estudo a circulação do dinheiro entre os agiotas e as redes de proteção, mobilização de recursos e de clientes. O trabalho de campo está sendo desenvolvido considerando especialmente a observação dos laços sociais pelos quais se movimentam recursos reais (Granovetter, 1973; Marques, 2003) e possibilitam as transações que viabilizam a prática de agiotagem popular. Considero a prática de agiotagem popular não apenas como uma relação de crédito, mas como uma relação de acumulação de capital moral, na qual confiança, honra e reputação entre os agiotas e suas redes são essenciais, dada uma constante avaliação econômica e moral (Zelizer, 2011). Nesse sentido, proteção, mobilização de recursos e indicação não são artifícios demandados apenas pelo agiota ou pelos outros membros da rede, mas são relações de dupla-troca, não necessariamente lineares e planejadas, e sim "relações sociais de circulação" (Urry, 2007: 197). Assim, o dinheiro que circula da casa do vizinho à casa do traficante de drogas, do salão de beleza ao desmanche de carros, viabiliza a construção e manutenção das redes do agiota. Trato aqui dos conceitos de rede (Castells, 1999) e circulação (Appadurai, 1986) enquanto chaves interpretativas que consideram que as relações estabelecidas dentro das redes são relações não verticalizadas e que não obedecem a um único comando ou a uma hierarquia (Freire-Medeiros e Lages, 2020). Desse modo, pode-se dizer que a circulação do agiota entre as redes e na cidade, constrói teias que amparam relações baseadas interesses mútuos que viabilizam as alianças e produzem reciprocidades. APPADURAI, Arjun (org.). The Social Life of Things: commodities in cultural perspective. Cambridge: Cambridge University Press, 1986. GRANOVETTER, Mark S. extend access to American Journal of Sociology. American Journal of Sociology, v. 78, n. 6, p. 1360-1380, 1973. MARQUES, Eduardo César. Redes sociais, instituições e atores políticos no governo da cidade de São Paulo. São Paulo: Annablume, 2003. URRY, John. Mobilities. Cambridge: Polity Press, 2007. ZELIZER, Viviana. Economic lives: how culture shapes the economy. Princeton: Princeton University Press, 2011.