ISBN: 978-65-87289-23-6 | Redes sociais da ABA:
GT47: Igualdade Jurídica e de tratamento: etnografias de narrativas, produção de provas, processos decisórios e construção de verdades
Apresentação Oral
Tatiana de Oliveira
"Justiça não é para nós": etnografia e possibilidades da pesquisa documental em confrontos entre punks e skinheads em Curitiba
"Tribunal de Justiça anula julgamento que condenou skinheads por morte de punk em Curitiba". A notícia de 08 de outubro de 2021 traz à tona uma questão que permeia o punk brasileiro desde o seu surgimento, em meados da década de 1980, e em Curitiba se faz presente cotidianamente entre uma parcela das pessoas que se reconhecem e são reconhecidas como punks. Em meu projeto de pesquisa contemplo, no âmbito da cultura punk, integrantes que se distinguem de outros principalmente em relação principalmente à classe. São os autointitulados punks das ruas, punks do subúrbio, punks maloqueiros, punks sujos ou punks de verdade. Tal distinção implica numa série de entendimentos e práticas que são alvo de críticas por parte dos comumente chamados punks de pub, punks burgueses, punks de final de semana, falsos punks ou apenas simpatizantes. Almejando qualificar minha inserção junto aos punks das ruas, realizei, em fase preliminar ao campo, pesquisa documental em processos judiciais e notícias veiculadas em diferentes meios de comunicação. Encontrei menções a ocorrências policiais, ações penais e episódios relatados que nem sempre chegaram a ser alvo de registro formal, desde 1986. Procurei ainda refletir sobre a influência das fontes documentais no campo e a própria ideia de trabalho de campo. Neste trabalho, após traçar uma breve contextualização do surgimento da cultura skinhead e sua relação com o punk, descrevo os confrontos a céu aberto que envolvem skinheads na cidade de Curitiba, de 1986 a 2005 e menciono outros, ocorridos após 2005. Descrevo ainda os percursos etnográficos que tornaram a pesquisa documental, antes compreendida como plano de fundo, à componente central na pesquisa. Finalmente, indico que a narrativa policial reforça o punk das ruas como corpo abjeto e, portanto como uma vida menos passível de luto - em sintonia com depoimentos de defesa de familiares ou dos próprios skinheads. As falas dos delegados negando a motivação racista dos homicídios, o descaso no pagamento de pensão para a mãe de um jovem assassinado, os famosos e caríssimos advogados de defesa dos skinheads, a demora dos julgamentos, a prescrição dos crimes, o ingresso de alguns skins no poder judiciário e no corpo policial e a vida empresarial bem sucedida de outros parecem operar na produção de verdades e discursos de modo que os punks sejam vistos como uma ameaça à paz e segurança de um sujeito adaptado ao sistema político e econômico.