GT 006: Antropologia da morte: teorias de ritual
Apresentação Oral em GT
Hugo Menezes Neto
Patrimônios afetivos e acervos familiares: Morte, memória e materialidades entre famílias vítimas da violência urbana em Belém-PA.
Nos dias 4 e 5 de novembro de 2014 ocorreu uma chacina em Belém do Pará, evento conhecido na cidade como “Chacina de Belém”, que resultou na morte de 11 jovens da periferia da cidade, atribuídas a policiais militares que ainda respondem judicialmente pelo episódio. Desde então acompanho cinco famílias das vítimas, pesquisando mais especificamente seus processos rituais de enlutamento, salvaguarda da memória e produção de acervo familiar. Neste work, portanto, apresento as primeiras análises do projeto de pesquisa apoiado pelo Programa de Apoio ao Doutor Pesquisador, da Pró-reitoria de Pesquisa e Pós-graduação da UFPA, com vistas a pensar como as famílias das vítimas da violência urbana lidam, entendem e se relacionam com as coisas deixadas por esses jovens mortos. Em outras palavras, o que fazer, ou como se relacionar, com roupas, fotos, documentos, livros, e demais objetos que um dia pertenceram a um filho hoje morto pela violência urbana?
Meu objetivo é refletir a respeito do processo ritual de musealização particular que articula luto, materialidade e violência, pensando nas especificidades desses ritual quando a morte está atrelada a um evento crítico de grande impacto social e familiar. Atento, outrossim, à seleção do que guardar ou descartar, às motivações, emoções e intuitos constituintes da ação de transformá-los em acervos familiares, expostos em cômodos da casa ou guardados em gavetas com acesso restrito, comunicando a ausência e ao mesmo tempo demarcando a presença dos jovens, reanimando memórias e acionando conexões entre mortos e vivos. Logo, as reflexões foram promovidas pela observação do movimento familiar de escolha, manutenção, manuseio e ressignificações desses objetos/coisas na constituição de um acervo, patrimônio afetivo, que materializa e/ou transubstancia discursos e imagens sobre os filhos assassinados no contexto de violência da capital paraense.
Tais análises filam-se ao campo antropológico do ritual, a retomar works e teorias basilares de Durkheim, Gluckman, Leach e, especialmente, Victor Turner. Como também apontam para as discussões atuais sobre representação e sentidos ontológicos que envolvem as relações entre humanos e coisas na perspectiva de Tim Ingold.