Redes sociais da ABA:
Logo da 30ª Reunião Brasileira de Antropologia
3 a 6 de agosto de 2016
João Pessoa - PB
UFPB - Campus I
GT 023: Diálogos no campo da Antropologia da Alimentação: Comensalidade, Ética e Diversidade
Apresentação Oral em GT
Marta Francisca Topel
A procura microscópica por Deus. A kashrut: um indicador delicioso para a análise do crescimento exponencial da ortopraxis no judaísmo ortodoxo contemporâneo
Nos últimas décadas, a ortodoxia judaica, definida como uma religião ortoprática, tem aumentado significativamente o número de preceitos relacionados à kashrut ou leis dietéticas judaicas. Segundo seus arquitetos, esta mudança tem como objetivo dar continuidade ao judaísmo tradicional. Entretanto, nos encontramos diante de um paradoxo: a manutenção, através dos avanços da ciência e das mais sofisticadas tecnologias, de um modus vivendi pré-moderno na Pós-modernidade. O objetivo principal desta proposta é compreender como os judeus ortodoxos se atualizam e conseguem respeitar as centenas de preceitos e costumes que regem as leis dietéticas judaicas. Para isso, se tentará elucidar os novos mecanismos de transmissão de uma cultura de comensalidade, cuja normativa discursiva já não depende da memória coletiva do grupo, mas de outras instâncias, sendo os peritos, especialistas em diferentes tipos de alimentos, insetos e tecnologias, aqueles que legislam sobre as velhas e novas regras. Diante desse panorama, perguntas como as que seguem são de relevância fundamental para compreender o novo modelo de kashrut. Assim, quais são os passos para preparar, diariamente, uma comida que exige levar à risca inúmeras regras, como: os tipos de ingredientes (hidropônicos, com determinado tipo e quantidade de pesticidas, devidamente abatidos por um perito ritual, adquiridos em determinado comércio, empaquetados de modo correto, etc.), a mistura dos ingredientes (laticínios com carnes ou laticínios e carnes com ingredientes neutros), o calendário judaico (o shabat, o ano sabático da terra e a páscoa judaica com todas as suas exigências e restrições), os diferentes tamanhos da rede das peneiras (para farinha comum, farinha integral, farinha de milho, etc.) além de conhecer as complexas classificações dos alimentos como sólidos, líquidos, fritos, fervidos, quentes e frios, crus e cozidos. O conhecimento aprofundado das leis da kashrut junto a outras que compõem a Lei judaica, leva a justaposições interessante. Assim, também faz parte da cultura de comensalidade do grupo saber que prece recitar e em que momento quando se prepara uma massa de determinado peso e definida segundo determinada categoria (fritura, massa para assar, massa para ferver, etc.), e por que não se deve receitar a prece caso as condições não a façam necessária, com os problemas decorrentes de recitar uma prece “injustificada” ou “sem sentido”. A análise desses fenômenos ilustram as novas abordagens sobre o fundamentalismo religioso que afirmam que ele é mais uma questão de performance do individuo e do grupo do que uma questão de fé ou experiência, além de nos mostrar uma relação singular com o que se come e o que é proibido comer.